domingo, 28 de setembro de 2014

Escola Multicultural


Certos hábitos, costumes e tradições, que ocorrem no seio das famílias, nem sempre são levados para a escola, por razões diversas: falta de abertura por parte de alguns dos responsáveis pelo sistema educativo, docentes, discentes, encarregados de educação, alunos/formandos, comissões de alunos e de pais, incluídos; ausência de currículos extra-programáticos; preconceitos de alguns agentes educativos; receio de exposição por parte das minorias étnico-sociais; recursos humanos, financeiros e infraestruturas não previstos.
Em tais circunstâncias e reconhecendo-se um vasto conjunto de condicionalismos, urge dinamizar a sociedade, desde logo estabelecendo parcerias, para se tirarem os maiores proveitos de um tão vasto e diversificado património cultural.
Criar, rapidamente, as condições para a constituição e funcionamento de parcerias, poderá ser um primeiro passo para a idealização e aplicação de projetos educativos que visem objetivos bem concretos e realizáveis, no espaço e no tempo, com público-alvo bem determinado.
Reconhecendo-se que as famílias, e a população em geral, não dispõem das condições mínimas para o arranque de tais projetos, parece pertinente admitir-se que a iniciativa parta de quem já possui conhecimentos e meios para fomentar a participação de outros parceiros, considerando-se estar em condições para um primeiro contributo, a comunidade docente, na área da investigação.
O grupo dos docentes, investigadores e pedagogos, ao elaborarem um projeto de intervenção educativa, em parceria com um outro agente, terá em atenção vários elementos étnico-culturais e sociais do respetivo parceiro, para que os objetivos delineados sejam alcançados, com os melhores resultados. Nesse sentido, investigar quais os problemas, quais os anseios, que tipo de participação pode um grupo dar ao projeto, é condição importante para o êxito da ação, que se pretende desenvolver.
Todo e qualquer projeto que ignora determinadas situações, culturas, meios disponíveis e a adesão responsável por parte dos futuros intervenientes, poderá estar condenado ao fracasso e, uma eventual reformulação pode criar resistências e suspeições. O património cultural dos povos gera nestes um sentimento nacionalista, de orgulho histórico-cultural e até etnocêntrico que é necessário saber compreender, contextualizar e valorizar no ambiente multicultural.
Por isso, a envolvência da família é fundamental: «Trata-se, consequentemente, de privilegiar uma concepção de participação familiar que considere as necessidades, os valores, as práticas educativas e as dinâmicas internas, próprias de cada família, numa perspectiva de respeito pela pessoa, pela sua cultura e pelas suas percepções particulares. A negociação e a concertação são, pois, abordagens a privilegiar.» (DIOGO, 1998:73).
Aferir-se, uma vez mais e na perspetiva da educação multicultural, da importância da família, como parceiro estratégico a privilegiar, será uma verdade irrefutável, mesmo que se considere a crise, que um pouco por todo mundo está a afetar as famílias, principalmente as mias carenciadas. Criar e proporcionar condições sócio-profissionais e económico-culturais às famílias é um desígnio universal, que todos os responsáveis políticos, pelas áreas da educação e da economia, devem procurar satisfazer.
Investir na educação, em ordem à construção de uma sociedade instruída, culta e cívica, corresponde a terminar com a maior parte dos conflitos mundiais, a médio prazo. No limite, significa, entre outras interpretações, igualmente legítimas, educar para a cidadania.
Bem no âmago da questão, estará sempre o desejo de um novo e diferente cidadão, o qual tem de ser preparado pelos agentes de socialização, com destaque, principalmente no tempo, para a família e para a escola. Deseja-se a intervenção de uma filosofia prudente
Urge proporcionar condições de interiorização de uma cultura para a cidadania, a partir da filosofia da educação, na vida ativa integrada na sociedade, na opção responsável por: princípios, valores, atitudes, participação num qualquer domínio democrático da sociedade. Nesta lógica: elaboração de teorias, projetos utópicos ou publicação de muitos artigos científicos, podem ser articulados com as experiências vivenciadas individual e/ou coletivamente e a sabedoria popular que resulta da acumulação dos saberes das várias gerações.
Educar para uma cultura da cidadania do século XXI, é um projeto que não pode dispensar a participação, tanto do cidadão anónimo, quanto do mais ilustrado académico, porque: «Em termos restritos, a cidadania consistirá, então, na inserção do indivíduo no espaço político e na participação dos cidadãos nas instituições sociais. Na perspectiva do Estado, a cidadania significa lealdade, participação e serviço em benefício da colectividade. Na perspectiva do indivíduo, a cidadania traduz-se por liberdade, autonomia e controlo político dos poderes públicos.» (FONSECA, 2001:43).
No exercício da cidadania plena, liberdade e autonomia são dois valores essenciais à dignidade da pessoa humana e, qualquer deles, entre muitos outros possíveis e igualmente fundamentais, não só devem ser divulgados e estudados, como também, exercidos plenamente.
O papel da educação revela-se aqui, e uma vez mais, de extrema importância e, nesse sentido, a escola tem a grande responsabilidade de ministrar: não só conhecimentos em redor daqueles valores; como também transmitir práticas consentâneas com os mesmos, ou seja, só em liberdade se consegue uma preparação para a vida autónoma do cidadão, por isso não se aceitará, hoje e sempre, sem mais discussão, uma escola e uma educação que ignorem as realidades circundantes a ela.
Qualquer que seja o estatuto da escola: básica, secundária, técnica, profissional, universidade, instituto politécnico, pública ou privada, ela não pode continuar a produzir trabalho científico, investigação, teorias e críticas a teorias que sirvam apenas para consumo interno e alimento para novas teorias.
 Reconheça-se que: «Uma escola alheada da vida é, talvez, a principal crítica que se lhe faz hoje. Esta crítica comporta três dimensões principais, correspondendo a: (I) redução e abstracção do mundo natural; (II) alheamento das realidades do mundo do trabalho e (III) não valorização do formando, não promovendo a criatividade e o desenvolvimento da sensibilidade e da afectividade.» (PORFÍRIO, 1992:108).
Ao novo cidadão que se deseja para este século XXI, deve ser-lhe concedida a oportunidade de exercer a liberdade e autonomia nas diversas atividades que, responsavelmente, vai exercendo ao longo da sua vida, sem qualquer prejuízo ou benefício por razões de estatuto racial, social, político, económico ou académico.
Capacidades latentes encontram-se nos vários escalões etários e sócio-profissionais e, quando os seus titulares pretendem colocá-las em prática, de uma forma legal e legítima, devem ser apoiados, por quem tem o poder institucional para os apreciar e avaliar. Pensa-se que deverá ser esta a postura dos responsáveis pelos sistemas educativos: seja na sua elaboração ou concetualização; seja na sua execução e avaliação. Com tal pressuposto, não haverá inconveniente na aprovação dos projetos apresentados pelos cidadãos.
Não se justificam certos preconceitos, a propósito de no país aumentar o número de graduados, nas diversas áreas do conhecimento, porque isso, a médio prazo, beneficiará a sociedade em geral, na medida em que passará a existir uma melhor compreensão dos problemas, mais criatividade para os resolver, ao invés de se poder estar a cair numa situação de pessoas indignadas, desmotivadas e improdutivas, porque não lhes foram reconhecidas capacidades, vocações, boa vontade, disponibilidade e alguns sacrifícios para concretizarem um projeto de vida, assente no conhecimento, na cultura, na liberdade, na autonomia, em suma, na plena cidadania que assiste à pessoa humana, genuinamente digna e que pode ser apoiada, também, pela comunidade científico-universitária.

Bibliografia

DIOGO, José M.L., (1998). Parceria Escola-Família. A Caminho de uma Educação Participada, Porto: Porto Editora.
FONSECA, António Manuel, (2001). Educar para a Cidadania. Motivações, Princípios e Metodologias, Porto: Porto Editora.
PORFÍRIO, Manuel, (1992). Metodologia do Projecto Tecnológico, Lisboa: Universidade Aberta.

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo 

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domingo, 21 de setembro de 2014

Desenvolvimento Integral


Num projeto de educação e formação, para a cidadania plena, tão importantes como o conceito, o currículo, os objetivos e os resultados, é o desenvolvimento pessoal, social e cultural, na perspetiva da construção e consolidação da personalidade do cidadão, respeitando, tanto quanto possível, a vocação própria do indivíduo, face ao que a sociedade democrática exige.
Cada pessoa tem características específicas, qualidades inatas, predisposição para certas tarefas, habilidades latentes que, através da aplicação do projeto educativo ajustado, podem ser potenciadas e rentabilizadas a favor do próprio, enquanto satisfação individual e alimento da auto-estima, como também em benefício da comunidade que, num dado domínio, pode assistir à resolução de problemas e situações mais difíceis.
Construir um projeto educativo, à medida de determinadas vocações, é um objetivo nobre, que não só dignifica a instituição escolar como enriquece todos os intervenientes na iniciativa, sejam educadores-formadores, sejam educandos-formandos e qualquer outro pessoal fora do contexto escolar, mas que sinta o chamamento vocacional para uma área da intervenção educativa.
Nesta linha de orientação, o perfil do cidadão que se pretende para os novos tempos que se avizinham, será o de um interventor decisivo na elaboração, desenvolvimento prático e validação do projeto vocacional, para o que, indiscutivelmente, carece de uma orientação credível e ao longo da vida, a qual será prestada por instituições escolares dos vários níveis do ensino/aprendizagem e formação, para o efeito dotadas dos recursos humanos, técnicos e financeiros especificamente apropriados e compatíveis, na medida em que nestes projetos, e no seu sucesso, se joga, em grande parte, a felicidade, em todos os sentidos do humanamente possível, da sociedade do futuro.
Com efeito, caminha-se para uma sociedade cada vez mais: exigente, instruída, informada, interventora e com poderes decisórios, porque: «Os jovens se tornam cada vez mais exigentes na definição do seu percurso profissional, a orientação vocacional (aqui situada em termos de educação de projectos) desempenham papel fundamental na construção individual de um projecto de existência.» (FONSECA, 1994:67).
Um projeto de existência, que dignifique este novo cidadão, não só enquanto tal, como ainda enquanto pessoa humana, portadora de princípios, valores, sentimentos, emoções, sonhos e projetos de vida, certamente, em função da sua cultura. Que maior riqueza e benefício para um país que, sem preconceitos xenófobos, etnocêntricos, religiosos, ideológicos ou outros, proporciona a toda a população, autóctone ou imigrante, condições para cada indivíduo realizar o seu projeto de vida?
Portugal e o Brasil, por exemplo, ainda que por razões diferentes e em épocas distintas, são hoje dois exemplos vivos, onde se encontram comunidades tão diversas quanto culturalmente ricas e produtivas. Impor, obrigar ou exigir que tais grupos sejam uniformemente segregados, por uma nova cultura, destruindo as culturas originais de cada etnia, grupo social e comunidades específicas, seria um crime de lesa-cultura universal, um verdadeiro genocídio cultural.
O património cultural que diferentes grupos étnicos transportam consigo, e o levam para os países de acolhimento, só pode ser bem recebido, divulgado e protegido, na medida em que será na troca de culturas, na diversidade de tradições e na importância dos valores, que a humanidade melhor se compreenderá e harmonizará.
Neste quadro que hoje se vive, um pouco em todo mundo, onde a mobilidade social transnacional se desenvolve, sujeita a restrições e controlos mais ou menos rígidos, exige-se uma intervenção bem planeada, dirigida a estes públicos, na maior parte das vezes, completamente desprotegidos, concedendo-lhes as oportunidades não só de se integrarem, como também para prosseguirem com as suas tradições e desvelamento da cultura que lhes é própria.
Chamar aqui a escola multicultural para coordenar, incentivar e consolidar uma educação intercultural, parece uma boa medida, quer para os nacionais, quer para os imigrantes. O sucesso na aposta da escola multicultural depende, em primeira análise, dos nacionais residentes: sejam técnicos docentes; sejam quaisquer outros cidadãos discentes, porque o objetivo será, no seu resultado final, todos interiorizarem as vantagens de uma educação, que promova e facilite o relacionamento exemplar entre indivíduos de culturas diversas, para o que se pressupõem competências, atitudes e abertura para conviver com situações diferentes das que eram habituais.
Com efeito: «A competência multicultural diz respeito à ausência de preconceitos raciais ou culturais e conhecimento de características de diferentes grupos raciais. Implicitamente, inclui também uma consciência cultural, que diz respeito a um indivíduo reconhecer que a forma como percepciona a realidade não é universal e que difere profundamente da percepção que dela têm indivíduos pertencentes a outras nações ou grupos étnicos.» (FERREIRA, 2003:140).
A capacidade técnico-pedagógica da escola multicultural, posta ao serviço da sociedade pluricultural, é uma mais-valia na conjugação de sinergias, em ordem à integração plena da população residente, oriunda de outros países, todavia, outros intervenientes e parcerias são desejáveis e que se envolvam neste processo intelectual. O intercâmbio cultural é decisivo para um melhor relacionamento.

Bibliografia

FERREIRA, Manuela Malheiro, (2003). Educação Intercultural, Lisboa: Universidade Aberta.
FONSECA, António Manuel Fonseca, (1994). Personalidade, Projectos Vocacionais e Formação Pessoal e Social, Porto: Porto Editora

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

domingo, 14 de setembro de 2014

Ética Societária: um compromisso com o dever


A sociedade do século XXI enfrenta, globalmente considerada, situações que são comuns a muitos povos, em muitas nações: produção e comercialização, praticamente indiscriminada: de armamento nuclear; terrorismo sob várias e sofisticadas formas, com objetivos diferentes e sempre destruidores; droga que se alastra e consolida numa rede de traficantes e toxicodependentes; doenças cuja cura definitiva dos pacientes e erradicação total do mal, estarão longe; desemprego que atinge todos os países, com taxas preocupantes em muitos deles; discriminação sob os mais diversos processos e maquiavélicas formas, desde logo, na distribuição da riqueza, inclusive, da que não foi colocada no mundo por nenhuma pessoa física, grupo ou instituição, que são os recursos naturais; conflitos locais, regionais e internacionais, cujas consequências se refletem mundialmente, com maiores repercussões nos povos mais desfavorecidos e indefesos; deficientes políticas para a saúde, educação, economia, trabalho e assistência social, entre outras.
Elencaram-se, apenas, algumas situações difíceis, sem objetivos pessimistas, bem pelo contrário, acreditando que o Homem, com o todo o seu potencial, vai conseguir resolver grande parte dos problemas, no curto e médio prazos, porque estão em causa valores como a segurança, a sustentabilidade de alguns sistemas político-sociais, o bem-estar e felicidade da humanidade, encabeçados pela superior dignidade da pessoa humana.
A realidade atual deve ser analisada com uma perspetiva de esperança na alteração, para melhor, de muitas daquelas situações. Seguramente que o ceticismo, a frustração, o desespero e outros sentimentos negativistas, não só não contribuem para resolver os problemas como, eventualmente, podem prejudicar a busca das melhores soluções.
Uma atitude de confiança nas capacidades humanas e no desenvolvimento de boas-práticas, constituem algumas das estratégias possíveis para se erradicarem do indivíduo, da comunidade e do universo, diversas patologias preconceituosas, que impedem o homem de se manifestar pelo seu lado bom, que lhe será inato. O processo que pode, em grande parte, contribuir para uma sociedade melhor, no sentido da justiça, da paz e do bem-estar coletivos, passa, também, e necessariamente, pela educação e formação éticas.
Na verdade, todo desenvolvimento, progresso, ordem e bem-estar de um povo passam por um processo de educação e formação profissionais, pelo trabalho e pela responsabilidade. De facto, de acordo com normas constitucionais, vigentes em todos os Estados Democráticos de Direito, todo o cidadão deve trabalhar, garantindo-lhe o Estado e a comunidade, em situações de normalidade constitucional, o direito à livre escolha da profissão e local para a sua realização.
 Concorda-se que: «O livre exercício da profissão cai sob o direito fundamental da livre escolha do género e lugar de trabalho. Se se negasse à pessoa humana, de modo radical, o livre exercício de uma profissão, isto equivaleria a uma coacção ao trabalho, mesmo quando a escolha da profissão se pudesse realizar livremente. Daqui se segue como norma geral: a) Cada qual pode estabelecer-se onde quiser, isto é, onde julgue encontrar condições apropriadas e convenientes para o exercício de sua profissão ou actividade; (…) b) Cada qual pode exercer a profissão a seu modo.» (WELTY, 1966:193-4).
Verifica-se, frequente e persistentemente, uma grande preocupação das comunidades, das organizações corporativistas, liberais, e outras, bem como por parte do indivíduo, particularmente considerado, pela reivindicação de direitos: muitos destes, legítimos, legais e justos; outros, que mais se aproximam da manutenção e/ou atribuição de novos privilégios.
Mas, ainda assim, poucos, muito poucos, são aqueles que reivindicam direitos para os que: já não fazendo parte do aparelho produtivo, do exercício de uma autoridade, que estão afastados da vida ativa, por razões diversas, não têm condições para fazer valer os seus direitos, ou alguns deles, ao nível dos direitos humanitários à saúde, ao trabalho, ao conforto e à dignidade.
Nesta situação se colocam milhares de idosos, os desempregados, os sem-abrigo, os marginais, os imigrantes e crianças e jovens em risco. Com exceção das Instituições de Solidariedade Social, Humanitárias, do Voluntariado e outras de defesa dos mais fracos e desfavorecidos, que têm demonstrado que é possível haver mais justiça e solidariedade, muito mais se poderia e deveria fazer ao nível das grandes organizações sindicais, patronais, ordens e do próprio Estado, para promoverem ações que visem acabar com tanta discriminação.
Haverá, porventura, alguma falta de sensibilidade para os valores da solidariedade, da caridade e da entre-ajuda; alguma ausência de ética para o dever de proteger os mais fracos e discriminados. Interiorizar um conjunto de valores, no domínio da ética social, que conduzam às boas-práticas da convivência humana, digna entre cidadãos, que deveriam ter todos o mesmo estatuto de cidadania, poderá ser uma outra estratégia que, apoiada em diversos recursos humanos e financeiros, eliminaria esta chaga social, que alastra com o aumento da discriminação e da exclusão social, política, laboral, cívica, religiosa e outras, mais se aproximando de uma “globalização da exclusão”, porque remete milhões de cidadãos, grande parte dos quais já deram, enquanto novos, o seu melhor à sociedade que agora os exclui, para os guetos da miséria, do esquecimento e do ostracismo. Não é justo, e quem tem responsabilidades, neste medonho paradigma da exclusão, deverá responder por isso e colaborar, ativamente, na construção de uma nova sociedade da inclusão de todos.
Uma ética societária, que apele para o compromisso do dever e motive para o cumprimento dos deveres sociais de solidariedade, de respeito pela dignidade de toda a pessoa humana e recuperação/integração de todos quantos estão excluídos, constitui, no início deste século XXI, um imperativo universal.
Assuma-se, inclusivamente, a Ética no seu sentido pragmático, de boas práticas, porque o importante e decisivo é que todo o cidadão interiorize o conceito do dever, como uma boa didática ao serviço daqueles que mais necessitam e já acima identificados.
Uma Ética dos valores religiosos, políticos, sociais, económicos profissionais e cívicos. Porque a Ética é a: «Arte de dirigir as acções do homem para a produção da maior quantidade possível de felicidade em benefício daqueles cujos interesses estão em jogo…» e na medida em que: «O princípio de utilidade oferece os critérios pelos quais podemos aprovar ou reprovar as acções humanas. Isto porque o que determina a aprovação ou reprovação de um ato é a forma como ele contribui para o aumento ou diminuição da felicidade ou do sofrimento dos indivíduos considerados. (BENTHAM, 1978, in PELUSO, 1991:32 e 34).
A comunidade em geral, e o indivíduo em particular, devem preparar-se para a construção de uma Nova Ordem Internacional para a Ética e para a Justiça, que imponha a igualdade no respeito pelas diferenças, sem discriminações: sejam privilégios; sejam exclusões negativas, num espírito de solidariedade, cada vez mais abrangente, aceitando, naturalmente, as diferenças entre indivíduos e povos, porque ela é natural e caracteriza cada parte.
A igualdade deve ser estabelecida, precisamente, no que respeita ao relacionamento interpessoal, no acesso às oportunidades e aos bens comuns, porque no restante, é muito complexo, eventualmente, injusto, tratar de forma igual aquilo que é desigual. O conceito de Justiça, a partir do respeito pelas diferenças, pode ser um atributo das democracias modernas.
Logicamente que: «As oportunidades devem se estender a todos os membros da sociedade e essa possibilidade deve ser garantida pelas instituições. As maiores expectativas daqueles em melhor situação, são justas se, e somente se, funcionam como parte de um esquema que melhore as expectativas dos membros menos favorecidos da sociedade. (…) Nesta perspectiva o princípio da diferença deve estar sempre presente porque é um princípio de justiça.» (SILVA, 2002:51-52).
A sociedade entre os vários grupos, quaisquer que sejam a natureza e os fins, naquilo que favorece o todo, deve revelar-se em todo o processo social, porque se em cada etapa se atingir um bem maior para o maior número, então, no final do percurso: «A uma solidariedade de ser-em-comum corresponderá uma solidariedade de acção-em-comum e uma solidariedade de fim-comum: o fim do Universo ou o bem-comum do Universo.» (SILVA, 1966:81).     

Bibliografia

PELUSO, L. A. (1991). A Ética Utilitarista como Ciência Social Aplicada: A Visão Engenharial de Jeremy Bentham. In Reflexão, Campinas, PUC-Pontifícia Universidade Católica, Nº 49 Jan./Abr. Pp. 27-47.
SILVA, A., S.J. (1966). Filosofia Social, Évora: Instituto de Estudos Superiores de Évora.
SILVA, K. F. (2002). As Concepções de Justiça segundo Platão e Rawls. In Phrónesis – Revista de Ética, Campinas: PUC-Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Vol. 4 (1) Jan/Jun. Pp. 37-58.
WELTY, E. (1966). Manual de Ética Social III – O Trabalho e a Propriedade. Trad. José da Silva Marques, Lisboa: Editorial Aster.

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

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domingo, 7 de setembro de 2014

Competência Cívica


Toda e qualquer intervenção pessoal, institucional, empresarial, política, religiosa associativa e coletiva, deve pressupor, sempre, determinados requisitos, destacando-se, para o presente trabalho, a competência na aplicação da Ética, no envolvimento cívico de cada pessoa na respetiva sociedade em que se integra.
Descrita a questão por outras palavras, significa que tal envolvimento postula valores de cidadania, compromissos cívico-político-institucionais, mas também todos os outros, que em cada momento o homem, por força dos vários papeis que vai desempenhando, tem o dever de assumir, sempre a partir dos deveres e dos direitos, nos limites, estabelecidos pela Ética.
A cidadania não impõe apenas cumprir deveres e exercer direitos, por quaisquer processos, sem regras, sem métodos e sem valores. Realizar e viver numa sociedade cidadã, requer dos indivíduos e das organizações competência, considerando que:
«A cidadania é um estado de espírito e uma postura permanente que levam pessoas a agirem, individualmente ou em grupo, com objectivos de defesa de direitos e de cumprimento de deveres civis, sociais e profissionais. Cidadania é para ser praticada todos os dias, em todos os lugares, em diferentes situações com variadas finalidades. Não se pode confundir cidadania com actos isolados e eventuais de protestos e reivindicações, muitas vezes justos, porém, efémeros.» (RESENDE, 2000:200).
 A sociedade há de constituir-se, compativelmente, com a superior dignidade da condição humana, impondo-se como grande desígnio universal a abolição total e imediata de todo e qualquer tipo de discriminação, simultaneamente com a moderação dos interesses individuais, quando colidem com os interesses coletivos; da redistribuição dos privilégios de alguns pelo todo que integra a sociedade; enfim, da aplicação ética da riqueza, da justiça, da educação, da saúde, do trabalho e de todos os recursos naturais e produzidos pelo homem, bem como daqueles que a natureza oferece ao homem, seja empresário ou trabalhador, dirigente ou subalterno; qualquer que seja a etnia, a religião, a nacionalidade do cidadão.
As nações, os povos e os indivíduos tendem, naturalmente, para a liberdade, entendida esta em todos os sentidos e situações da vida humana, concretamente, quanto às liberdades: cívica, política, religiosa, educativa, laboral, intelectual, filosófica e tantas outras formas, nas múltiplas dimensões humanas.
Mas a liberdade a qualquer preço, exercida sem regras, sem limites e sem responsabilidade, termina na ditadura de uns sobre os outros. Deseja-se, então, uma liberdade democrática, no conceito mais nobre que a democracia pode comportar, do tipo “um por todos e todos por um”, ou ainda no seu sentido político, igualmente sublime, como sendo o “governo do povo, pelo povo, com o povo e para o povo”, porém, dentro dos limites, dos valores e princípios da cidadania.
A liberdade democrática, para uma sociedade cidadã, exige competência dos cidadãos para a exercer. Uma liberdade com autoridade, na medida em que: «É pela autoridade que a liberdade política se solidariza com o bem comum; é pela liberdade das pessoas e dos grupos que a autoridade política atinge o bem comum, subsidiário, ou seja, não há liberdade nem autoridade isentas da funcionalidade para o bem comum.» (SILVA, 1966:177-8).
Vivenciar e usufruir dos benefícios da cidadania, numa sociedade democraticamente livre será, porventura, a situação que todo o cidadão responsável e competente deseja. O cidadão moderno, culto, no sentido antropológico que o conceito de cultura implica, capaz de utilizar, para o bem-comum, todas as suas capacidades cognitivas, técnicas e humanas, deverá ser formado, rapidamente, através e pelas diversas instituições da sociedade global: família, escola, Igreja, comunicação social, comunidades, vizinhos, empresas e até pela “Instituição” Natureza que tanto pode ensinar, quando o homem lhe presta atenção.
A formação deste novo cidadão passa pela adoção de soluções urgentes, que as referidas instituições, cada uma com os seus próprios conhecimentos, experiências e recursos, pode, interdisciplinarmente, contribuir, porque na verdade: «Urge dinamizar o movimento de cidadania para que a sociedade cumpra suas missões de promover – abandonando a postura de total dependência de governos salvadores da pátria – mudanças necessárias ao desenvolvimento económico, social e educacional do país; de construir uma civilização mais evoluída, de tornar o país uma nação rica e forte, como permitem seus recursos, bem como a inteligência e capacidade de trabalho de seu povo.» (RESENDE, 2000:202).
Obviamente que cada país tem seus próprios recursos, porém, há recursos naturais que, pragmática e materialmente considerados, proporcionam desenvolvimentos diferentes, todavia, apesar disso, cada povo tem o recurso mais valioso que existe, traduzido no seu capital humano, no seu engenho, habilidade e arte. Nos seus valores, usos, costumes e tradições.
A prova verifica-se pela análise do nível de progresso e bem-estar que países sem recursos naturais estratégicos, (petróleo, ouro, diamantes, gás natural, madeiras preciosas, entre outros), usufruem atualmente, com a agravante de, inclusivamente, alguns deles, serem de reduzida dimensão territorial. Tais países apostaram na formação dos seus cidadãos, no seu capital humano, na inteligência, na cultura, na democracia, na liberdade responsável, na cidadania competente do seu povo.
Indiscutivelmente que são muito importantes a educação e a formação cívica para se construir um novo mundo, moderno, humanista: «É necessária uma educação que favoreça o tecido da sociedade civil (ou seja, civilizada, cidadã). Que a educação seja um lugar de encontro e empenhamento comum onde aprendamos a ser sociedade, onde a sociedade aprenda a ser sociedade solidária. Temos de aprender novas formas de construir a cidade dos homens.» (BERGOGLIO, 2013:86).

Bibliografia

BERGOGLIO, Jorge, Papa Francisco, (2013). O Verdadeiro Poder é Servir. Por uma Igreja mais humilde. Um novo compromisso de fé e de renovação social. Tradução de Maria João Vieira /Coord.), Ângelo Santana, Margarida Mata Pereira. Braga: Publito.
RESENDE, Énio (2000). O Livro das Competências. Desenvolvimento das Competências: A melhor Auto-Ajuda para Pessoas, Organizações e Sociedade. Rio de Janeiro: Qualitymark.
SILVA, A., S.J. (1966). Filosofia Social, Évora: Instituto de Estudos Superiores de Évora.  

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

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