domingo, 25 de dezembro de 2016

A Magia do Natal

Ano após ano, a festa tradicional, alegadamente da família, celebra-se com mais ou menos pompa e circunstância, designadamente, nas suas principais dimensões: material, religiosa, social; ou conforme os objetivos de cada pessoa, independentemente dos seus valores, crenças, tradições e cultura; e, também, ainda há quem passe indiferente por esta festa, encarando o dia de Natal, como um outro qualquer dia do calendário anual
Na cultura da sociedade Portuguesa, o Natal continua a ser a festa da família, período de tempo em que se procura reforçar os laços parentais ou, em muitos casos, a reconciliação dos entes mais queridos que, por vicissitudes várias da vida, estiverem desavindos durante mais ou menos tempo.
O reencontro dos familiares, também dos amigos verdadeiros, naquele dia mágico constitui motivo de grande felicidade e, quantas vezes, de acerto do passado, da resolução de situações mal resolvidas ou, ainda, por solucionar, de cedências, desejavelmente, sinceras e generosas, das partes até então conflituantes.
Natal de todos, para todos e com todos: adultos e crianças; famílias e amigos; colegas de trabalho e patrões; camaradas de armas, independentemente de o serem em tempo de guerra ou de paz; tempo para recordar traquinices de infância, malandrices escolares, paixonetas de adolescentes, namoros e compromissos, enfim, um mundo de vivências e de recordações, que se tenta reconstruir, se possível com as pessoas que também as experimentaram connosco.
Mas esta magia, que tão bem carateriza o Natal, vive-se, ainda mais intensa e sinceramente, no mundo das crianças, que na sua ingenuidade e simplicidade, aguardam com imensa ansiedade, a “chegada” do “Menino de Jesus”, precisamente na noite da consoada, em que a família, os amigos incondicionais, quando convidados, se juntam para tomarem a refeição tradicional daquela noite mágica, e que varia, relativamente, de região para região, mesmo dentro do mesmo país.
Em geral, as famílias constroem o presépio, alusivo ao nascimento de Jesus, implantam a denominada “Árvore de Natal”, que enfeitam e iluminam, no cimo da qual é colocada a estrela, qual farol que, dias mais tarde, nos princípios de Janeiro, guiará «Belchior, Baltazar e Gaspar, também conhecidos como os três Reis Magos, viajaram ao encontro do menino Jesus alguns dias após o seu nascimento. De acordo com a Bíblia, livro sagrado do cristianismo, essa visita datou de 6 de Janeiro, período do ano até hoje marcado por comemorações e tradições em diversos países do mundo.
Reconhecidos como santos pela Igreja Católica no século 8, Belchior da Europa, Baltazar da África e Gaspar da Índia presentearam Jesus com itens representativos de sua cultura. Ouro, mirra e incenso simbolizavam realeza, pureza e fé, respectivamente.» (in: http://vivomaissaudavel.com.br/bem-estar/psicologia-infantil/como-os-reis-magos-sao-lembrados-mundo-afora/ ).
O presépio é, porventura, o símbolo maior e mais encantador do Natal. Ele como que irradia uma atração irresistível, as figuras que o integram, parecem reais, com vida e, bem protegida, a cabana onde estão Maria e José com o seu filhinho, Jesus, aquecidos, naquela noite fria de Dezembro, pelos animais.
A simplicidade, a humildade e o amor estão ali expostos para o mundo habitado por uma humanidade que não consegue entender-se, devido aos mais diversos e, por vezes, incompreensíveis e inaceitáveis interesses, não obstante todas as pessoas terem perfeito conhecimento que, sem exceções, a vida físico-intelectual e sócio-material é, tão só, uma passagem efémera, por um mundo que se renova e morre a cada instante.
O Natal das crianças, também dos adultos, deveria ser uma quadra de paz, de alegria, de fraternidade e de perdão, quanto mais não fosse por um futuro melhor, no qual se possa acreditar, que seria: de conforto, de abundância, de tranquilidade, de segurança, de liberdade, de igualdade, de justiça, de solidariedade, de amizade, de lealdade e de gratidão, entre pessoas e povos que habitam um mundo que, afinal, não é deles.
A Quadra Natalícia, tal como a Quaresma por ocasião da Páscoa, porém, numa perspetiva diferente, designadamente para as religiões que comemoram estes períodos festivos, reveste-se de um significado muito intenso, porque vivido com as mais profundas convicções culturais, e uma Fé muito grande no devir melhor. É um tempo mágico, de esperança.
O Natal, para quem acredita que pode ser uma Festa da Família, que neste período é possível resolver muitas situações do passado, proteger um futuro de concórdia, enfim, para quem deseja viver esta festa com o coração, deve ser encarado como mais uma oportunidade de vida, agora no sentido de que há sempre uma porta aberta e, quando esta, apesar de tudo, se fecha, é preciso confiar na possibilidade de que uma janela pode abrir-se para a bem-aventurança.
Experienciar o Natal, não tanto e exclusivamente com uma racionalidade materialista, mas também, e por que não, com uma abertura do coração aos outros, ao mundo, ao futuro que se deseja de amor, de saúde, de trabalho, conforto, felicidade, justiça e paz, porque o Natal deve ser isto tudo, e muito mais.
E, já que não parece possível, por falta de vontade individual e coletiva, viver o Natal todos os dias, então que se faça um esforço, ou se tenha um gesto de boa-vontade para que, ao menos, neste curto período de tempo, a denominada Quadra Natalícia, para interrompermos algumas atividades materialistas, e refletirmos sobre o que está menos bem, naqueles que, durante todo o ano, não têm nada: casa para se abrigarem condignamente; roupa para se agasalharem; comida para se alimentarem; trabalho para se dignificarem; saúde para uma melhor qualidade de vida, enfim, para darem à sociedade o que dela nem sempre recebem: colaboração.
O Natal pode, e deve, ser vivido, com um coração magnânimo receptivo às dificuldades, compreensão e ajuda ao próximo. Uma mente aberta para ajudar quem mais precisa, para reavaliar o passado, corrigindo o que foi feito erradamente, ou menos bem, e adotar novas posturas para o presente, porque todos somos irmãos em Cristo (para os crentes, mas não só), até porque, para os não crentes, somos seres da mesma espécie, pessoas humanas, que possuem princípios, valores, sentimentos e emoções.
Hoje, primeiro quarto do século XXI, talvez mais do que em tempo algum, vivemos períodos muito difíceis, situações que, por vezes, atingem níveis de “bestialidade”, selvajaria, conflitos sangrentos, em que nem sequer os valores humanos de: tolerância, compreensão, generosidade, misericórdia e compaixão são respeitados.
Então, pelo menos, neste período tão curto, que simbolicamente transmite uma nova esperança, através do nascimento do “Menino de Jesus”, que neste tempo maravilhoso e mágico de Natal, os nossos corações “amoleçam”, que se deixem penetrar pela caridade, pelo amor e pelo perdão.
É tempo de: cada pessoa por si própria; os grupos, quaisquer que sejam a sua constituição e objetivos nobres; os povos e as nações se solidarizarem para o bem-comum, para os valores: da liberdade, da lealdade, da segurança, da paz e da abundância, se congregarem à volta dos sentimentos do amor, da gratidão, da estima e consideração, relativamente para com quem é nosso familiar, amigo, colega, enfiem, para com todas as pessoas.
Hoje, é fundamental disciplinarmos os nossos corações para o bem, para a ajuda a quem mais necessita, para atendermos a quem solicita o nosso apoio, a nossa amizade, a nossa presença, a nossa benevolência, o nosso perdão.
Hoje, é tempo de concedermos aos nossos verdadeiros e incondicionais amigos, mais atenção, mais carinho, um pouco mais de tempo, ainda que seja para, com amizade autêntica, tomarmos um, dois, muitos “cafezinhos”, de solidariedade, de bem-querer e de esperança na recuperação de sentimentos, entretanto perdidos, abandonados ou, infelizmente, passados à indiferença, ao ostracismo, pela rejeição e pela humilhação de quem continua, apesar dos comportamentos, a ser nosso genuíno e “incorrigível” amigo do coração.

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
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domingo, 18 de dezembro de 2016

As Ciências Cognitivas nos Direitos Humanos

A Filosofia, atualmente, tem vindo a encontrar sérios obstáculos, quanto à tradicional e milenar importância que vinha mantendo, face ao avanço das ciências em geral e das ciências cognitivas em particular.
As ciências da cognição, não só se apresentam como um novo género epistemológico, como também reivindicam, para o seu objeto de estudo, aqueles problemas que abordam as questões antropológicas, tradicionalmente características das análises filosóficas e teológicas.
Entretanto, e no tema que aqui interessa aflorar, o que se pergunta é como é que as ciências cognitivas podem auxiliar a humanidade, no cumprimento integral dos Direitos do Homem?
Uma abordagem antropológica em que a categoria “relação” assuma a importância fundamental, não a relação homem-Deus, porque esta é inevitável para todo o homem crente e, mesmo o não-crente, em situações-limite, também procura relacionar-se com o Transcendente.
Analogamente, emerge como um imperativo categórico, implementar uma praxis relacional, homem-a-homem, porque: «torna-se necessário ter em conta que todo o discurso humano, quer o discurso bíblico, quer o discurso filosófico-teológico, quer igualmente o discurso científico, não podem deixar de recorrer a modelos e analogias. Por, consequente, falar de uma ou mais antologias que constituam como que a “ossatura” de uma “antropologia integral”, filosófica, teológica e científica, não pode deixar de significar falar de ontologias elaboradas em contextos de determinados modelos de saber em vários domínios...». (DINIS, 1998:587).
Nesta “lógica” e sob o princípio e convicção da fé, aceita-se que: «Deus chama todo o homem (...). É evidente que esta chamada pessoal de comunhão (...) torna-se possível pela existência de uma determinada estrutura psicofísica (...). Tenha-se além disso presente que este chamamento divino determina o substrato criatural profundo do homem, fá-lo ser aquilo que é. A transcendência do homem sobre o meramente mundano, a sua capacidade de superar os condicionalismos deste mundo, bem como a sua “imortalidade”, derivam portanto do facto deste chamamento à comunhão com Deus (...). O ser pessoal do homem, pressuposta a sua constituição psicossomática está constituído por esta possibilidade que se lhe oferece de entrar em comunhão com Deus.». (Ibid.:588).
Desenvolvendo aquele modelo e transferindo a relação Deus-homem para homem-a-homem, verifica-se que seria possível, pelo menos e para já, tentar-se implementar este novo paradigma, porque: «Além disto, a categoria de relação recupera todo o discurso contemporâneo acerca do carácter relacional do corpo e da pessoa, não apenas no convívio social, mas também com a sua relação e todo o universo. (...) A pessoa é toda a realidade relacional que foi “construindo”, através da sua vida, da sua história pessoal desde o momento da concepção. Esta totalidade da existência humana que é a pessoa, embora se vá desvanecendo com o tempo, sobrevive de algum modo na sua memória enquanto vive na história...» (Ibid.:590).
O cumprimento dos deveres em ordem à salvaguarda e respeito pelos Direitos Humanos, não poderá deixar de adaptar, na prática, um modelo idêntico ao que se acaba de descrever, para resolver a velha dualidade corpo-alma, na medida em que, se todos os seres humanos se configuraram à imagem e semelhança de Deus-Pai, então, encontra-se n’Ele o princípio unificador e respeitador dos mais sagrados Direitos do Homem.
Portanto, não deve repugnar aos filósofos, e muito menos aos homens não-crentes, este recurso epistemológico e, agir uns para com os outros, em comunhão, responder solidariamente quando chamados a cooperar para o bem comum da sociedade de que todos fazem parte, numa globalidade de Direitos e Deveres. Aqui sim, é fundamental que todos os responsáveis se preocupem com a universalização da globalização.
A ciência, desejável e naturalmente, vem contribuindo para que os Direitos Humanos possam ser observados, na medida em que resolve muitos problemas de natureza económica que estão na origem das violações daqueles direitos, todavia não será a única via.
Nesse sentido, FEYERABEND é bem claro: «Em todos os tempos, o homem tem inspeccionado o seu contorno com os olhos bem abertos e uma inteligência fecunda, em todos os tempos faz descobertas incríveis e em todos os tempos podemos aprender das suas ideias.» (1997:302).
No virar de século e de milénio e neste primeiro quarto do novo século, não se teme o progresso científico, entendido como categoria antropológica, com vista à harmonização de uma convivência humana sadia e justa.
As ciências, quaisquer que sejam, não podem deixar de estar ao serviço do bem-estar da humanidade. É neste sentido que se pretende continuar a desenvolver raciocínios, atitudes e comportamentos. Igualmente, neste contexto poder-se-iam abordar várias perspectivas do progresso científico:
Conceito Neopositivista – Perspectiva Formalista do progresso científico, cujos representantes: «acreditam firmemente que tinham encontrado no princípio da verificação o critério rigoroso e definitivo para confirmar teorias científicas e, por conseguinte, para determinar quando uma nova teoria representa ou não um progresso.» (DINIS, 1998:587);
Conceito Popperiano – Criticou o neopositivismo. Para Popper: «O progresso científico obtém-se quando as teorias resistem a sucessivas tentativas de falsificação. (...) O que confere cientificidade a uma teoria é a possibilidade de vir a ser submetida a testes e falsificada. (...) A resistência aos testes aproxima a teoria da verdade e representa um critério de progresso científico.» (POPER apud. FEYERABEND, 1997:2);
Conceito Kuniano – «O progresso científico verifica-se através de revoluções científicas, isto é, da substituição revolucionária de um paradigma por outro. O novo paradigma resolve mais anomalias e tem uma capacidade heurística superior à do anterior. Nesta perspectiva o progresso é visto em termos estritamente epistemológicos.» (Ibid.:3);
Conceito Lakatosiano – «O progresso científico não se verifica na passagem de uma teoria a outra, mas sim de um programa de investigação científica a outro. (...) Um programa de investigação progride enquanto o seu crescimento teórico se antecipa ao seu conhecimento empírico, isto é, enquanto continua a predizer factos novos com algum sucesso...» (Ibid.:4).
As definições de progresso defendidas pelos autores antes invocados, revelam preocupações quanto à validade e manutenção dos paradigmas científicos que, por sua vez, se desenvolvem num ciclo vicioso de lutas entre velhos e novos paradigmas.
Em quaisquer uma daquelas perspectivas, o problema central prende-se com a ciência, entendida como progresso, revoluções científicas, aperfeiçoamentos, novas descobertas para problemas que, elas próprias, as ciências positivas, originam, seja através do armamento, seja pela supremacia do poder político-económico, o certo é que nem sempre se têm aproveitado as suas potencialidades para melhorar o respeito pela dignidade humana.


Bibliografia


DINIS, Alfredo, (1998). Implicações de Desenvolvimento em Biologia e Ciências Cognitivas, in Revista Portuguesa de Filosofia, Tomo LIV, Braga, 1998, Fasc. 3-4
FEYERABEND, Paul, (1997). Tratado Contra el Método. Tercera Edicion, Madrid: Teknos. 

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domingo, 11 de dezembro de 2016

Direitos Humanos e a Paz para um Mundo Melhor

O direito à paz constitui um dos direitos da chamada terceira geração, segundo a estrutura estabelecida, tais como outros direitos ecológicos. Parece, contudo, cada vez mais, um objetivo, importante e necessário a alcançar e salvaguardar, não fossem os inúmeros conflitos regionais de guerra declarada ou latente: seja por motivos políticos; seja por razões de ordem religiosa, ou outras.
A “Instituição da Guerra” apresenta-se como uma ordem de tal magnitude que transcende qualquer agressor-vítima particular, na medida em que faz mais sentido responsabilizar um país por uma agressão sobre outro, do que imputar culpas a indivíduos isolados, além de que existe, obviamente, violência estrutural, na medida em que danos não intencionais são infligidos, frequentemente, a indivíduos ou países em todo o mundo, porque o opressor está incrustado nas estruturas, com culturas que não deixam outras alternativas.
A agressão é provocada e algumas das causas são estruturais, outras culturais: o colonialismo é uma dessas estruturas que ligam a colónia ao poder colonial, de tal forma que aquela pode revoltar-se para se libertar. Ora, o caminho para a paz passa, necessariamente, por resoluções imaginativas dos conflitos, o que pode significar a transformação de algumas estruturas através da substituição de culturas de violência por mecanismos de apoio ao desenvolvimento Sócio-Cultural, científico e económico dos povos, até então oprimidos.
O homem tem o dever de procurar e construir um mundo melhor, porque: «O direito de viver em paz também pode ser interpretado como o direito de não ser vítima da agressão. Mas se assumirmos que a agressão não é aleatória mas causada por factores estruturais e culturais entre e dentro dos actores, então o direito de viver em paz é o direito de viver num cenário social (...) onde se faz qualquer coisa sobre factores e não só sobre actores...» (HAARSCHER, 1993:213).
A construção de um mundo melhor, no sentido de promover e preservar a paz, quaisquer que sejam os conceitos deste valor inestimável (mesmo o mais rudimentar, como aquele que define paz como ausência de guerra), passa, certamente, pelo conhecimento dos valores universais constantes na Declaração Universal dos Direitos Humanos, e dos instrumentos legais, técnicos e científicos para os defender.
 É necessário combater o irracionalismo que tanto parece estar na moda, sendo certo que atitudes irracionais, não se fundamentam na observância dos direitos humanos e, mesmo aceitando que todo o conhecimento humano é falível e incerto, também não é menos verdade que o conhecimento é uma procura da verdade, de teorias explicativas e, objetivamente, verdadeiras.
Neste contexto, não é difícil compreender que qualquer violação dos Direitos Humanos constitui um erro grave, contudo: «combater a falha, o erro, significa pois, procurar uma verdade mais objectiva e fazer tudo para detectar e eliminar tudo o que é falso. (...) Ao reconhecermos a falibilidade do conhecimento humano, reconhecemos, simultaneamente que nunca podemos estar completamente seguros de não termos cometido algum erro.» (POPPER, 1992:18).
As boas-práticas de deveres que conduzem a soluções pacíficas de conflitos humanos, naturalmente, carecem de profundos conhecimentos ético-morais, de cidadania, de Saber-ser e Saber-estar no mundo com os outros, numa permanente postura de tolerância e responsabilidade intelectual.
Infelizmente, o número de casos e de vítimas não para de aumentar: campos de concentração, assassinatos, violação de mulheres e crianças, deportações, emigração forçada, enfim, destinos terríveis, horrores que matam pelo medo. Seres humanos: homens, mulheres, crianças, idosos, são vítimas de fanáticos inebriados por um qualquer poder fundamentalista.
O homem intelectual, culto e responsável tem hoje, mais do que no passado, o dever inalienável de rejeitar o relativismo radical, na medida em que há valores que jamais se podem relativizar: Deus, verdade, bem, justiça, paz, liberdade e tantos outros, aliás, as posições radicais não conduzem, geralmente, a soluções equilibradas, afigurando-se do mais elementar bom-senso, optar por atitudes moderadas.
Com efeito: «O pluralismo crítico apresenta uma posição de acordo com a qual, no interesse da verdade, cada teoria – e quanto mais teorias tanto melhor – deve ser posta em plano de concorrência com as demais. Esta concorrência consiste na discussão racional: isto significa que o que está em causa é a verdade das teorias concorrentes. Aquela teoria, que na discussão crítica parecer aproximar-se mais da verdade é a melhor e a melhor teoria prevalece sobre as menos boas. O mesmo se passa com a verdade.» (Ibid.:178).
A Paz constrói-se a partir de um conhecimento cada vez mais profundo das realidades humanas e, todas as ciências serão poucas, todos os cientistas e intelectuais não serão bastantes para prosseguirem na busca de um mundo melhor, no sentido, não apenas de ausência de guerra, mas também, e principalmente, no que respeita ao dever do cumprimento dos Direitos Humanos, sejam estes individuais ou coletivos, pelo que, de facto, urge refletir sobre o que as ciências cognitivas podem fazer por um mundo em efervescência. Afinal, onde é que está localizado, no cérebro humano o “bom-senso”? Questão, aparentemente simples e inócua, cuja resposta parece que ainda não é conhecida.
Poder-se-á colocar aqui a questão da vontade e liberdade suficientes, para se resolver a deprimente situação da violação dos Direitos Humanos? Será que, também aqui, o homem está determinado por circunstâncias que não controla nem domina? Ou, pelo contrário, tem o homem a capacidade para alterar alguma coisa?
Porque segundo Searle: «A liberdade humana é precisamente, um facto de experiência. Se desejar alguma prova empírica de tal facto, podemos sem mais aludir à possibilidade que sempre nos cabe de falsificar quaisquer predições que alguém possa ter feito acerca do nosso comportamento. Se alguém prediz que eu vou fazer alguma coisa, posso muito bem não fazer essa coisa.» (SEARLE, 1987:107).
E, ainda nesta mesma linha, o autor prossegue, mais adiante, afirmando o seguinte: «A ciência não deixa espaço para a liberdade da vontade (...). Por outro lado, somos incapazes de abandonar a crença na liberdade da vontade.» (Ibid.:113).
A liberdade da vontade não depende, portanto, do determinismo porque, de acordo com o raciocínio de Searle: «A forma de determinismo que em última análise é incómoda não é o determinismo psicológico. A ideia de que os nossos estados da mente, são suficientes para determinar tudo, o que fazemos é provavelmente falso. (...) Se a liberdade é uma ilusão, porque é que é uma ilusão que, aparentemente, somos incapazes de abandonar? A primeira coisa a observar a propósito da liberdade humana é que ela está essencialmente ligada à consciência. Apenas atribuímos liberdade aos seres conscientes (...) a maior parte dos filósofos pensam que a convicção da liberdade humana está essencialmente ligada ao processo da decisão racional. (...)».
«A experiência característica que nos dá a convicção da liberdade humana, é uma experiência da qual somos incapazes de arrancar a convicção da liberdade, é a experiência de nos empenharmos em acções voluntárias e intencionais. (...) É esta experiência a pedra basilar da nossa crença na liberdade da vontade (...)» porque: «No comportamento normal cada coisa que fazemos suscita a convicção válida ou inválida de que poderíamos fazer alguma coisa mais, aqui e agora, isto é, permanecendo idênticas todas as outras condições», donde e concluindo: «(...) a evolução deu-nos uma forma de experiência da acção voluntária onde a experiência da liberdade, isto é, a experiência do sentido de possibilidades alternativas, está inserida na genuína estrutura do comportamento humano, consciente e intencional.” (Ibid.:114-120).
Será legítimo e correto afirmar-se que a construção de um mundo de paz depende muito mais do homem, que na sua liberdade e vontade, não estará sujeito ao determinismo absoluto, porque pode voluntária e intencionalmente criar as condições, através das ações concretas, para um entendimento global, naturalmente que tal intencionalidade pressupõe abdicar de interesses diversos que possam colidir com a arquitetura de uma paz duradoira, num mundo moderno, solidário e fraterno, onde todos os homens tenham uma oportunidade de cooperar mutuamente.

Bibliografia

HAARSCHER, Guy, (1993). A Filosofia dos Direitos do Homem. Trad. Armando F. Silva. Lisboa: Instituto Piaget.
POPPER, Karl R, (1992). Em Busca de um Mundo Melhor, 3a Ed. Trad. Teresa Curvelo. Lisboa: Editorial Fragmentos.
SEARLE, J., (1987). Mente, Cérebro e Ciência, Lisboa: Edições 70, (pág. 105-121)

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domingo, 4 de dezembro de 2016

Fraternidade Luso-Brasileira

Todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade…» (CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, CF/1988, Artº 5º) «Aos cidadãos de língua portuguesa com residência permanente em Portugal são reconhecidos, nos termos da lei e em condições de reciprocidade, direitos não conferidos a estrangeiros.» (CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, 2004: Artº. 15º, nº 3).
Elaborar um conceito, uma caracterização, ou estabelecer o paradigma de “Cidadania Solidária Luso-Brasileira”, em função de um novo perfil de cidadão democrático Luso-Brasileiro, para o presente século, é tarefa complexa para se realizar, até porque, antes e depois deste trabalho, muitos investigadores, teóricos, pragmáticos e autodidatas se preocupam com o tema e, no futuro, novos e melhores trabalhos surgirão, sem qualquer dúvida.
Este esforço pretende dar um muito humilde contributo para irmanar, total e absolutamente, brasileiros e portugueses e, nessa perspectiva, construir uma “Pátria Luso-Brasileira”, obviamente, no domínio de uma “Cidadania Solidária”, um país civicamente unidual, com que muitos sonham, no respeito pelas soberanias políticas e territoriais e na conjugação da Língua, da História e da Cultura, no sentido do progresso, da ordem e da cidadania plena.
Neste contexto, tão idealizado e na construção prática deste novo cidadão, é desejável que ele parta sempre de uma postura ética correta, seja brasileiro seja português, do espaço lusófono, ou até de qualquer outra nacionalidade, porque: «concordamos que conduta ética tem a ver com respeito próprio. Sabemos que pessoas que se sentem bem consigo mesmas possuem o que é necessário para resistir a pressões externas e para fazer o que é certo, e não o que é meramente conveniente, popular, ou lucrativo.» (BLANCHARD & PEALE, 1988:10).
O novo cidadão iniciará a sua formação nos valores éticos inerentes ao respeito pelos direitos e deveres que a cada indivíduo assistem. Na circunstância, os cidadãos que desde há mais de quinhentos anos se desejam como irmãos, embora nem sempre tal ambição se tenha concretizado em pleno, buscam, uma vez mais, a realização absoluta deste sonho e, justamente, as excelentes relações político-diplomáticas, empresariais e culturais, parecem, finalmente, ajudar a alcançar este objetivo primordial. Por isso, é essencial defender uma conduta ética correta, sem ambiguidades, sem tibiezas, desde logo: nos domínios políticos, culturais, educacionais, cooperação e negócios.
Este cidadão, que já a partir do primeiro quarto, deste novo século, é tão necessário à reconstrução de uma sociedade segura, livre, solidária e socialmente desenvolvida, trata-se de uma pessoa cuja dignidade é vulnerável, em algumas circunstâncias, à ofensa. Este cidadão formar-se-á nas escolas tradicionais e também nas dificuldades da vida. A educação assente em bases sólidas será o cimento para o exercício dos deveres e direitos da cidadania solidária.
A formação, apenas por medida e conveniência, não será parte exclusiva dos valores educacionais deste novo cidadão, embora se admita a possibilidade de, a título preventivo, poder consciencializar-se de modelos ditos educativos, fornecidos por instituições que visam objetivos diferentes daqueles que aqui se postulam.
Sem descurar uma formação profissional para o desempenho de uma atividade que sirva a sociedade, e possibilite uma existência condigna ao cidadão e à sua família, urge facultar uma preparação mais humanista, que reequilibre uma certa tecnocracia com as práticas dos valores clássicos e universais, através do estudo dos temas e dos autores adequados.
A este nível, as universidades desempenham um papel crucial, ao proporcionarem condições de pesquisa, de inovação, de reinterpretação de conceitos e de práticas. Nesse sentido o que seria mais desejável é que os cidadãos do futuro, frequentassem a universidade porque: «A observância dos princípios democráticos tem sido um facto, por certo, em alguns casos e, sempre que o é, a universidade pode servir de modelo para a comunidade local.» (RICH, 1975:279).
Nos modernos Estados de direito democrático, tais como hoje se apresentam o Brasil e Portugal, bem como uma significativa maioria de países em todo mundo, o cidadão no pleno uso das suas capacidades, deveres e direitos, é chamado a participar na vida ativa da sua comunidade: seja em tarefas políticas, sociais, culturais, religiosas e profissionais; seja na organização da ocupação dos seus tempos livres.
Esta multiplicidade de papéis que são exigidos do cidadão, que se tem vindo a delinear, é o pressuposto normal do funcionamento de uma democracia, que exige longa preparação, e que pode começar no seio da família, na Igreja, na escola, na empresa, mas que não convém ser interrompida. A aquisição de hábitos democráticos é um processo dinâmico, nunca acabado, e jamais é perfeito, na medida em que: «Este treino para a democracia, deve ser desenvolvido, como dissemos, em toda a actividade da vida. E uma vez que o objectivo da Educação deverá ser o desenvolvimento da consciência social, a vida caracterizar-se-á, sob esta perspectiva, por uma vontade contínua e não por proibições e restrições.» (CARVALHO, 1979:63).
O cidadão luso-brasileiro estará irremediavelmente “condenado” à aprendizagem através da educação para os: “Saber-ser”, “Saber-estar”, “Saber-fazer” e “Saber-conviver-com-os-outros”, porque estas quatro superdimensões da Pessoa, proporcionam, quando realizadas conscientemente, o funcionamento da sociedade ideal, atentas as insuficiências e imperfeições da condição da espécie humana.
Infere-se, do anteriormente investigado, que a educação, apenas pela escola, considerando até todos os níveis de ensino é, ainda assim, insuficiente, se se limitar à reprodução, repetição e avaliação dos conhecimentos, já adquiridos no passado. Claro que a escola se preocupa com a atualização de conhecimentos, técnicas, tecnologias, princípios e valores societários. (TA-547)

Bibliografia

BLANCHARD Kenneth & PEALE, Norman Vincent, (1988).  O Poder da Administração Ética, Tradução Ruy Jungmann, Rio de Janeiro: Editora Record.
CARVALHO, Maria Lúcia Rocha Duarte, (1979). Escola e Democracia, Subsídio para um Modelo de Administração segundo as ideias de M.P. Follet, São Paulo: E.P.U., Editora Pedagógica Universitária, Lda., Campinas: Universidade Estadual de Campinas.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL (CF/88), in LOPES, Maurício António Ribeiro (Coord.), (1999), 4ª. Ed., revista e atualizada, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, (2004), Porto: Porto Editora.


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